Com toda certeza, a UEFA Champions League é o torneio menos
alternativo do mundo, por motivos óbvios. Porém, de uns anos pra cá, graças a
uma política adotada pela UEFA, a competição está começando a fazer jus ao nome,
passando a ter mais campeões. De fato, o nível técnico da competição caiu um
pouco, pois se antes tínhamos o 4º colocado do campeonato inglês, hoje temos o
campeão da eslovaco. Apesar dessa perca de nível, venhamos e convenhamos, é bem
mais legal ver times campeões de torneios com uma realidade completamente
distinta, além de se uma chance de presenciarmos partidas de centros menores.
Indo nessa direção, cremos ser pouco provável que haja time mais alternativo
nessa Liga dos Campeões que o Nordsjaelland, que é alternativo até mesmo em seu
país, a Dinamarca.
Se pedirmos para qualquer o nome de algum clube dinamarquês,
poucos saberão falar sequer o nome de 1. Talvez o Copenhague (Kobenhaven para
os mais íntimos), e para os que acompanham o esporte na terra que serviu como
cenário de Hamlet, certamente apontarão o Brondby, time que revelou os irmãos
Laudrup.
Desde que o Campeonato Dinamarquês assumiu o nome de
Superliga, em 91, vimos 6 campeões, sendo que o já citado Copenhague domina o
futebol local, com 9 conquistas nesse período, além de várias participações na
fase de grupos da Champions, que sempre traz uma bela grana. Pra ser mais
exato, das 9 conquistas do time da capital, 8 ocorreram na década passada, com
o clube montando bons plantéis com o dinheiro ganho justamente nas
participações da competição continental. Bem, mas o assunto não é o FCC (ou
FCK, dependendo do freguês), e sim o Nordsjaelland.
Pretendemos falar do time que vai disputar essa Champions,
mas falar sobre a história do clube parece ser uma boa ideia. O Nordsjaelland é
fruto de uma peculiaridade do futebol dinamarquês; falta de dinheiro = fusão.
Muitos clubes passam por crises financeiras, e o meio mais praticado para
continuar na ativa é promover fusões entre clubes, o que lembra bastante o
futebol paranaense. O próprio Copenhague é fruto de uma fusão, que inclusive
envolveu o clube mais antigo da Europa continental. No caso do time abordado
hoje, a fusão ocorreu entre o Farum IK e o Stavnsholt BK, fusão esta encorajada
pelo até então prefeito da bucólica Farum (localizada à 25km da capital
Copenhague), Peter Brixtofte, e no principio, o time se chamava Farum BK. Sobre
os dois clubes que deram origem ao atual, pouco se sabe. Chegamos a pesquisar
fontes dinamarquesas, mas não encontramos nada. Em relação ao prefeito, bem,
encontramos muito, até demais pra falar a verdade. Brixtofte governou a cidade
de 85 à 2002, conciliando o cargo político com a presidência do clube, e
atualmente está preso por corrupção, e o Farum foi um dos alvos do político. Em
2002, o político-cartola fez um acordo com uma série de empresas que atuavam na
cidade; o poder público pagaria valores superfaturados por serviços básicos, e
em troca, essas companhias patrocinariam o time, e esse foi apenas um dos
vários escândalos que envolveram Brixtofte.
Esportivamente falando, em apenas 11 anos, o Farum atingiu a
elite do futebol local, e logo em sua primeira temporada na 1ª Divisão, conseguiu
uma vaga na Copa da UEFA 2003-04, onde acabou eliminado na 3ª eliminatória para
o Olympiacos, com direito a uma sapatada de 5 x 0 em Atenas.
Depois desses eventos controversos, o clube quase vai a
falência, pois não havia ninguém no comando, e não se sabia de onde sairia
dinheiro para manter o clube. Nisso, o time é adquirido por uma companhia, que
é comanda pelo empresário Allan Pedersen, em 2003, adotando o nome atual, que
nada mais é que o nome da região em que está situado, a Zelândia do Norte. A
mudança de nome teve basicamente duas motivações; Pedersen nunca escondeu que
queria livrar o time da má imagem trazida pelo escândalo com Brixtofte, e a
outra é uma suposição nossa. Farum é uma cidade com apenas 18,000 habitantes, o
que a torna pequena até mesmo para os padrões dinamarqueses, e além disso,
podemos cravar que quase metade dos habitantes são imigrantes. Pensando nisso,
adotou-se um nome que atendesse toda a região, o que poderia trazer mais apoio
da população das cidades vizinhas. Indo nesse sentido, a nova diretoria firmou
parcerias com várias equipes da região (cerca de 50), que são das divisões de
acesso do dinamarquês, ou amadoras mesmo, em que o clube tem preferência de
compra para atletas tidos como promissores. Além disso, esses clubes são
beneficiados com alguma ajuda, indo de uma quantia monetária, amistosos, uso da
estrutura do Nordsjaelland para treinos, e empréstimo de atletas.
Porém, nem tudo são flores nesse processo. Pedersen é um
empresário, logo, espera obter algum tipo de retorno, o que ficou evidenciado
em um episódio, quando cogitou-se a mudança de cidade para o time, pois em
Farum muitos ainda não esqueceram o episódio de 2002, e a equipe parecia não
receber o apoio necessário. Ao que tudo indica, isso foi superado, pois o time
apresenta uma média de aproximadamente 5,000 mil expectadores por jogo, o que
não é muito, mas considerando os 18,000 habitantes e os 10,000 lugares
disponíveis no Farum Park, não é de todo ruim, e há um dado que deve ser
observado; o recorde de público da cancha foi atingido no último jogo da
temporada passada, no dia 23/05 desse ano, contra o Horsens (que estranhamente
recebeu 10,300 torcedores). Logo, podemos dizer que a cidade está otimista com
o time, levando os planos de mudança para longe, pelo menos aparentemente.
Voltando um pouco no tempo, mais especificamente para o período antes da temporada 2011-12, o Nordsjaelland fazia campanhas estáveis na
Superliga, em momento algum repetindo a campanha do 1º ano na elite, o que
indicava que nãoo havia possibilidade de crescimento, mas os observadores mais
cuidadosos enxergavam exatamente o contrário. Sob o comando do jovem Morten
Wieghorst (no clube desde 2006), o clube conquistou duas Copas da Dinamarca de
maneira seguida (2009-10 e 2010-11), garantindo vagas para competições europeias,
fazendo um belo caixa, que serviu para estruturar o clube e contratar alguns
reforços pontuais. Mesmo com esses crescimento, não enxergava-se a equipe
brigando pelo maior título nacional. Nesse quadro, chegamos na temporada de 2011-12,
a qual falaremos agora.
O comando técnico do time está nas mãos do jovem Kasper
Hjulmand. No clube desde 2008, ocupando a função de auxiliar de Morten
Wieghorst, só passou a comandar o time a partir de 2011, quando Wieghorst
assumiu a seleção dinamarquesa sub-21. Quando coloca-se o comando do time com
um treinador inexperiente, o otimismo não é dos mais altos, não que houvesse
pessimismo, mas a expectativa era de que a equipe mantivesse a constante dos
últimos anos. Entretanto, logo em sua temporada de estreia, Hjulmand foi
campeão, comandando um time repleto de jovens, que tinha a movimentação no
ataque, a segurança na defesa, e sobretudo, a versatilidade dos atletas, como
principais marcas. A conquista surpreendeu a todos, pois o time apresentou uma
melhora substancial se comparado à equipe 6º colocada do certame de 2011.
O destaque do time foi a defesa, que sofreu apenas 22 gols,
a melhor de todo o campeonato, e que tem o goleiro Hansen, no clube desde 2003,
com um breve empréstimo em 2005 (para um dos times que fazem parte da rede),
como nome mais emblemático. O ataque,
com 49 gols marcados, não foi o melhor da competição, pra ser mais exato, foi o
5º mais eficiente em um campeonato com 12 equipes. Na armação, todos os
jogadores atuaram mais de uma vez em cada um dos setores do campo (exceto na
volância, que tem vaga cativa), ocupados por um 4-5-1, assim como o homem de referência no ataque. O time procura ir ao ataque de maneira consciente, prezando pela
posse de bola. Para se ter ideia, em apenas 2 partidas o clube teve uma média
de posse de bola inferior ao adversário; na derrota fora para o Midtjyland (2 x
1, 49%) e na goleada de 4 x 0 sobre o Lyngby, em Farum (47%), coincidentemente,
2 jogos seguidos. A equipe polariza o jogo no meio de campo, tanto que os
artilheiros do time foram meias, Christensen (que atuou em todas as partidas da
Superliga) e Meckmann (que ficou de fora em apenas 2 ocasiões), ambos com 8
gols.
O jogador que atuou mais vezes na meia cancha foi o veterano volante de contenção Stokholm. Capitão do time, ele é a principal liderança do time, e mesmo com 36 anos, ficou de fora de apenas 3 partidas dentre as 33 do campeonato nacional. Tamanha é a confiança no capitão é que ele é o cobrador oficial do time.
O jogador que atuou mais vezes na meia cancha foi o veterano volante de contenção Stokholm. Capitão do time, ele é a principal liderança do time, e mesmo com 36 anos, ficou de fora de apenas 3 partidas dentre as 33 do campeonato nacional. Tamanha é a confiança no capitão é que ele é o cobrador oficial do time.
Grande parte dos jogadores estão no time há muito tempo,
como lateral-direito (que eventualmente atua pela esquerda) Kindeltoft, no
clube desde 2007, o zagueiro norte-americano Parkhurst, chegado em 2008, e os
avançados (termo mais preciso para atletas que atuaram tanto no meio como no
ataque) Andreas Laudrup, filho do lendário Michael Laudrup, e o atacante sueco
Lawan, atuam no time desde 2009. Outro ponto é que há relativa segurança
administrativa da equipe, o que explica a ida do holandês Mtiliga, que antes
estava em um instável Málaga.
“Estabilidade relativa” por quê o clube está envolvido em
mais uma polêmica. Para ser mais exato, toda a polêmica está (de novo) em seus
diretores. A companhia que detinha a propriedade da equipe passava por uma
difícil situação financeira, e o seu dono, Allan Pedersen, vendeu a equipe...para
ele mesmo. Até aí, a legislação financeira dinamarquesa (que diga-se de
passagem, é bem flexível) tolera, mas o problema foi o valor; a negociação foi
fechada por cerca de 500 mil krones (por nossas contas, a cotação krone - euro
é de aproximadamente 7, 50 krones para 1 euro), mas a justiça dinamarquesa
cotou o valor do clube em 35 milhões de Krones. A pendenga está sendo
investigada, e a justiça do país colocou um prazo de 4 anos pra decidir algo.
Assim sendo, o futuro da equipe não é dos mais definidos, mas
ao que parece, a cidade de Farum parece ter abraçado o time, e lutará pelo
futuro dele. Agora que o time está na fase de grupos da Champions League, é que
a alegria é geral, e todos estão ansiosos para que o Farum Park possa ser
aceito para mandar esses jogos. O mínimo que a UEFA exige para que se sediem
jogos de suas competições máximas é 8,000, além de outras exigências, que vão
de lugares VIP à locais para análise de doping, mas o mais provável é que os
jogos serão mandados na capital, que não é tão longe assim.
Provavelmente, o Nordsjaelland não fará frente à nenhum
rival do Grupo E, que contará com Shaktar Donetsk, Juventus e o atual campeão
Chelsea, mas o provavelmente não entra em campo, e por quê não, a equipe possa
repetir o APOEL da temporada passada? Afinal de contas, a Liga dos Campeões
anda meio previsível, e um pouco de alternatividade sempre é bom.
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